Meia hora antes da sessão de Proibido Proibir, no celular com um amigo.
O amigo:
"Po, cara, não sei se vai dar pra chegar aí a tempo, mas quero muito ver esse filme, quero ver os caras que em vez de ir refletir no Arpoador, vão para a sujeira da Baía de Guanabara". (Não entendi a frase até então).
Sei que ao longo de toda a projeção eu pensava: "Ai meu deus, esse filme tá muito bom, to sentindo que vou ter uma decepção no final. Tomara que vá assim até o fim...". E, para minha felicidade, no plano final, pensei: "É um dos melhores filmes do ano e um dos melhores brasileiros dos últimos anos". Pode ser exagero meu, e quem ainda não assistiu vai criar muita expectativa, mas Jorge Durán estava muito inspirado quando filmou Proibido Proibir.
Durán juntou três jovens e talentosos atores e deu a eles personagens estudantes da UFRJ: Caio Blat como Paulo, estudante de Medicina, Maria Flor como Letícia, estudante de Arquitetura e Alexandre Rodrigues como Leon, estudante de Ciências Sociais. O cenário do espaço público é o lugar perfeito para uma amostragem do Brasil e do Rio de Janeiro: as salas de aula, o hospital universitário, a Baía de Guanabara poluída, como pano de fundo da Ilha do Fundão, o cenário dos protagonistas. Por outro lado, o cenário ainda mais degradado da Baixada Fluminense, quando Paulo decide ajudar uma paciente do hospital, tentando localizar seus filhos. É assim que Paulo, Leon e Letícia mergulham no contraste social. Aqui, o que poderia ser mais uma leitura clichê da favela, ganha um tom de realidade impressionante. Esse foi um dos méritos de Durán: filmar a precariedade das favelas com personagens reais. O tom documental no depoimento de moradores soaria falso não fosse a continuidade da uma boa direção e dos bons diálogos entre Leon e a amiga de faculdade Ritinha, ora empenhados em mudar a situação social de pobreza, ora em tom de desespero com a falta de perspectiva.
Paralelo aos problemas sociais, o namoro entre Letícia e Leon é ameaçado pelas investidas de Paulo, que divide apartamento com Leon. Na parede da casa, que logo se tornará o cenário principal quando o foco do filme fecha nos três personagens, as referências são a pintura "A lição de anatomia", de Rembrandt, onde cientistas dissecam o corpo de um marginal que foi condenado à morte, e um pôster de O Invasor, de Beto Brant, para lembrar que, apesar da trama paralela de romance, estamos num mundo cão. São os personagens que repetem que "tá tudo podre".
Nem passa pela cabeça fazer analogia de Proibido Proibir com Jules et Jim ou Os Sonhadores (neste último a luta política dos personagens é mais por voluntarismo), pois no filme de Durán a violência social grita no pé da orelha dos três e atinge cada um. Afinal, somos cariocas, por conseqüência kamikazes, e bem sabemos o risco que corremos todos os dias. Letícia até chega a achar que o telhado das casas na Vila da Penha é parecido com os vistos no cinema francês, mas isso é no início, quando tudo vai bem. Francês mesmo só a frase "Proibido Proibir", pichada nos muros do longínquo 68. Longínquo pela própria deturpação que Paulo faz da frase, usada agora somente para a liberdade do sexo e das drogas.
O cinema de Durán é o espaço privilegiado da reflexão. Só aqui a crítica à uma imprensa de classe média que faz vista grossa para o que acontece nos espaços marginais da cidade, só aqui vemos pichado o CV que os jornais não noticiam mais.
A vontade e a necessidade de fuga dos três difere de um final moralista de fragmentação do amor. Ainda assim, é o precário que permanece. É a Baía de Guanabara que "serve" de vista. Está tudo podre. É o amor que resta.
Proibido Proibir (Proibido Proibir), Brasil/Chile, 2006, 100min
Direção: Jorge Durán
Roteiro: Jorge Durán e Dani Patarra
Edição: Pedro Durán
Fotografia: Luís Abramo
Elenco: Caio Blat, Maria Flor, Alexandre Rodrigues, Edyr Duqui, Raquel Pedras, Adriano de Jesus, Luciano Vidigal
Um comentário:
Concordo cm você e acho que esse é um dos melhores filmes (brasileiros) dos últimos anos e vou além, acho que esse é um dos melhores filmes brasileiros de todos os tempos.
Ah! eu sou paulistano e mesmo assim me indentifiquei muito com esse filme, creio que esse filme seja cosmopolita o suficiente para que ocorra com jovens de qualquer país.
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