segunda-feira, dezembro 05, 2005

A NOIVA-CADÁVER, de TIM BURTON e MIKE JOHNSON



O que se diz por aí é que Tim Burton persistiu tanto em seus filmes que acabou por criar estilo inconfundível. É verdade. Nada tenho a acrescentar a esse dado. Entretanto, por mais que haja coerência ou mais do mesmo, como querem os que não gostam do diretor, devo confessar que continuo sendo surpreendido a cada filme. Em A Noiva Cadáver há uma série de elementos burtonianos (não sei se este termo existe) como o gótico, o fantástico e a presença de Johnny Depp, que estão também em filmes como Edward, mãos de tesoura, A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça e, mais recentemente, a releitura de A Fantástica Fábrica de Chocolate. A despeito de todas as ferramentas que se repetem em cada filme, Tim Burton, em co-direção com Mike Johnson, consegue inovar e prender o público que vai assistir aos 80 minutos da fantástica história, baseada no folclore russo, de Victor Van Dorf, um filho de novos-ricos que está prometido a Victoria, filha de aristocratas em decadência. No ensaio para o casamento, sob a autoridade de um severo pastor anglicano, Victor não consegue repetir a declaração que terá de fazer à noiva no grande dia. Depois de fugir da igreja durante o teste, caminhando por uma floresta tenebrosa, Van Dorf repete todo o discurso e acaba por acordar do túmulo Emily, a noiva que fora assassinada pelo ex-futuro marido antes do enlace. Desperta, ela crê que Victor é o noivo que veio libertá-la e o leva para o mundo dos mortos a fim de promover o casório da dupla vivo-morta. Curiosamente, a oposição entre mortos e vivos é invertida e destoa da corriqueira idéia de que o além é sempre assustador. Aqui, no nosso mundo, impera um tom solene acompanhado de um constante cinza de cenários, personagens e humores, como de fato é, e lá, uma festa de cores e irreverência. Outra opção interessante é a de desviar, mais para o fim, o foco de atenção de Victor para Emily (por mais que o filme leve o título noiva-cadáver, a tendência poderia ser a de privilegiar e centrar a narrativa em Victor. Por ser personagem masculino, por ter a voz de Johnny Depp e, por que não, por ser de nosso mundo e, logo, se aproximar mais de nossa compreensão), mostrando as reações, a vingança e o destino da noiva-cadáver. Neste filme, Tim Burton volta às origens da carreira de animador, que começou nos estúdios da Disney, em 1982. Utiliza a técnica de stop-motion - a filmagem quadro a quadro de cada cena dos bonecos feitos de aço inoxidável e recobertos de silicone - já adotada em O Estranho Mundo de Jack, em 1993, na contra-maré de desenhos feitos inteiramente por computação gráfica. Talvez o comentário soe engraçado para um desenho de animação, mas até o trabalho de fotografia se faz notável e merece destaque. Como não podia deixar de ser, a voz de Victor é dublada por Johnny Depp, sem falar na semelhança de traços entre o personagem e o ator. Extra filme o que fica? A certeza de que Tim Burton consegue sucesso entre pipocas e cults. Tese radicalmente comprovada pela pesquisa de campo do antropólogo informal aqui (rsrsrs), na fila do Odeon, onde vejo adolescentes (de roupas, botas e tênis pretos, acessórios de metal, olhos pintados à la Edward mãos-de-tesoura) que mais parecem estar num show da Pitty e adultos e pseudo-adultos com olhar blasé (alguns com óculos retangular de armação preta, camisa quadriculada, tênis all star) como que entrando num Paissandu ou Estação Botafogo da vida. Em comum, a espera ansiosa para assistirem ao mesmo filme e a satisfação com o resultado, na saída.

A Noiva-cadáver (Corpse bride), 2005, Reino Unido, 80 min
Direção: Tim Burton e Mike Johnson
Animação com as vozes de Johnny Depp, Helena Bonham Carter, Emily Watson, Albert Finney, Chistopher Lee, Joanna Lumley

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